sexta-feira, 18 de março de 2011

Mojud e a Vida Inexplicável

(inspirado em um conto sufi)

Mojud era um funcionário de uma repartição pública em uma pequena cidade do interior. Não tinha qualquer perspectiva de um emprego melhor, e seu país atravessava uma grande crise econômica, e Mojud já estava resignado em passar o resto de sua vida trabalhando oito horas por dia, e tentando divertir-se durante as noites e os finais de semana, vendo televisão.
Certa tarde, Mojud viu dois galos brigando. Com pena dos animais, foi até o meio da praça para separá-los, sem dar-se conta que estava interrompendo uma luta de galos-de-briga. Irritados, os espectadores espancaram Mojud. Um deles ameaçou-o de morte, porque o seu galo estava quase ganhando, e ia receber uma fortuna em apostas.
Com medo, Mojud resolveu deixar a cidade. As pessoas estranharam quando ele não apareceu no emprego – mas como havia vários candidatos para o posto, esqueceram rápido o antigo funcionário.
Depois de tres dias viajando, Mojud encontrou um pescador.
- Onde você está indo? – perguntou o pescador.
- Não sei.
Compadecido da situação do homem, o pescador levou-o para sua casa. Depois de uma noite de conversas, descobriu que Mojud sabia ler, e propos um trato: ensinaria o recem-chegado a pescar, em troca de aulas de alfabetização.
Mojud aprendeu a pescar. Com o dinheiro dos peixes, comprou livros para poder ensinar ao pescador. Lendo, aprendeu coisas que não conhecia.
Um dos livros, por exemplo, ensinava marcenaria, e Mojud resolveu montar uma pequena oficina.
Ele e o pescador compraram ferramentas, e passaram a fazer mesas, cadeiras, estantes, equipamentos de pesca.

Muitos anos se passaram. Os dois continuavam a pescar, e contemplavam a natureza durante o tempo que passavam no rio. Os dois também continuavam a estudar, e os muitos livros desvendavam a alma humana. Os dois continuavam a trabalhar na marcenaria, e o trabalho físico os deixava saudáveis e fortes.
Mojud adorava conversar com os fregueses. Como agora era um homem culto, sábio, e saudável, as pessoas lhe pediam conselhos. A cidade inteira começou a progredir, porque todos viam em Mojud alguém capaz de dar boas soluções aos problemas da região.
Os jovens da cidade formaram um grupo de estudos com Mojud e o pescador, e logo espalharam aos quatro ventos que eram discípulos de sábios. Um dos jovens perguntou, certa tarde:
- Mojud resolveu abandonar tudo para dedicar-se a busca da sabedoria?
- Não – respondeu Mojud. – Eu tinha medo de ser assassinado na cidade onde vivia.
Mas os discípulos aprendiam coisas importantes, e logo transmitiam à outras pessoas. Um famoso biógrafo foi chamado para relatar a vida dos Dois Sábios, como eram agora conhecidos. Mojud e o pescador contaram o que tinha acontecido.
- Mas nada disso reflete a sabedoria de vocês – disse o biógrafo.
- Tem razão – respondeu Mojud. – Mas é a verdade. – Nada de especial aconteceu em nossas vidas.
O biógrafo escreveu durante cinco meses. Quando o livro foi publicado, transformou-se num grande êxito de vendas. Era uma maravilhosa e excitante história de dois homens que buscam o conhecimento, largam tudo que faziam, lutam contra as adversidades, encontram mestres secretos.
- Não é nada disso – disse Mojud, ao ler sua biografia.
- Santos precisam ter vidas excitantes – respondeu o biógrafo. – Uma história tem que ensinar algo, e a realidade nunca ensina nada.
Mojud desistiu de argumentar. Sabia que a realidade era o que ensinava tudo que um homem precisa saber, mas não adiantava tentar explicar isso.
“Que os tolos continuem vivendo com suas fantasias”, disse para o pescador.
E ambos continuaram a ler, escrever, pescar, trabalhar na marcenaria, ensinar os discípulos, fazer o bem. Só prometeram nunca mais tornar a ler livros sobre vida de santos, já que as pessoas que escrevem este tipo de livro não compreendem uma verdade bem simples: tudo que um homem comum faz em sua vida o aproxima de Deus.

2 comentários:

  1. Linda tarde !!

    Adorei !! O ser humano tem uma necessidade de criar deuses !! Eles precisam ser perfeitos !
    Uma ves li sobre um reporte que foi entrevistar irmã Dulce , a encontrou varrendo o patio do convento... achou aquilo estranho.
    Adorei seu blog !!

    Um lindo domingo !! bejos !!

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  2. Olá Ana Clara!
    Obrigada pela visita.
    Este seu blogue eu nunca deixo de visitar desde que haja novidade...eheheheh
    Bj
    Milai

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